quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

O atrofio da espécie II

...ainda sobre o atrofio da espécie, há também quem invista com convicção e tente fazer negócio com a estupidificação da face feminina da mesma.

Em análise os mais recentes cartazes da publicação feminina juvenil Happy Woman, a mesma que, nos seus cartazes de apresentação há uns anos atrás, se auto-promovia com um erro de ortografia.

A publicação pretende comunicar uma imagem rebelde, sexy, independente, cosmopolita, feminista, emancipada, moderna, consciente, etc., com slogans que, das duas uma, ou revelam enorme aptidão para a estupidez ou uma preocupante pretensão de estupidificar.

"Gosto de dormir nua. E depois?"
Esta afirmação e esta pergunta surgem do nada. É verdade que algum universo masculino poderá perder algum tempo a fantasiar com adolescentes nuas mas isso já acontece normalmente. Trata-se de uma estratégia de marketing mal pensada dado que essa clientela procurará outras fontes, mais especializadas e directas ao assunto, para fantasiar, nunca a Happy Woman. O slogan expõe também uma necessidade histérica de afirmação, que faz sentido, dado o carácter adolescente da revista, notando-se especialmente um desejo de provocar choque, de agitar as águas, o problema é falhar completamente o objectivo. Gostas de dormir nua. E depois? Ainda bem para ti. Eu por acaso também durmo nu, conheço outras pessoas que o fazem, a minha mulher, por exemplo. Também conheço pessoas que gostam de churros, e depois? Estás em Portugal, não estás no Irão, podes até dormir metida numa burka que ninguém se chateia com isso.

"Não tenho religião. E depois?"
Só agora é que perceberam que as aulas de religião e moral são um franchise dissimulado com o patrocínio do Vaticano para tomar o pulso aos jovens e tentar cristianizar umas ovelhas? Ludwig Feuerbach, teólogo, antropólogo, filósofo, desmascarou os fenómenos da religiosidade e reapresentou-lo-nos como meras fantasias ficcionais para o indivíduo se explicar a si próprio, ou para usar como ferramenta de controle do próximo, há quase cento e setenta anos. E antes dele outros pensaram e morreram sobre o assunto. Não tens religião. E depois? Estás em Portugal em 2010, não estás numa comunidade Mórmon no Utah há cem anos atrás, quem é que se chateia com isso? ...mas do mal o menos, antes tarde do que nunca.

"Não gosto de política. E depois?"
Ok, agora sim, sinto-me insultado. Temos aqui uma publicação presumivelmente rebelde, sexy, independente, cosmopolita, feminista, emancipada, moderna, consciente, etc., a tentar vender a ideia de que gostar-se de política é uma caretice, uma tendência em desuso, uma desnecessidade, e fá-lo com o orgulho desprezível da adolescência. O único slogan que apresentam capaz de produzir alguma coisa tem como objectivo alienar e desligar as miúdas da realidade. No tempo do Salazar havia a Crónica Feminina, que ensinava as raparigas a coser, a cozinhar e a focarem-se nas coisas realmente importantes, nomeadamente: a viverem para os maridos e a servirem-se de alicerce para a família. Trinta e cinco anos depois temos a Happy Woman a ensinar as miúdas a enfeitarem-se, a fazer broches e a focarem-se nas coisas realmente importantes, nomeadamente: a deixarem a tomada de decisões exclusivamente para os homens e a concentrarem-se em tornar-se nos seus objectos de adorno.

Nada contra os broches mas... ninguém se chateia com isto?

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